Teológico Pastoral

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sábado, 18 de outubro de 2014

HOMILIA DOMINICAL - 19 DE OUTUBRO DE 2014

DESCONCERTANTE JESUS


“Daí a César o que o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Mt 22,21)

Jesus foi um homem que viveu e falou de tal maneira que se tornou desconcertante para aqueles que o conheceram e se aproximaram dele. Até o final de sua vida, Ele desconcertou todo mundo.
Desconcertou, sobretudo, aqueles que estavam confortavelmente instalados na estrutura religiosa e política da época: os fariseus e herodianos, que se uniram para armar-lhe uma cilada.
Jesus desconcertou porque colocou o ser humano no centro de sua missão; Ele tornou-se surpreendente porque não se conformava com a situação injusta imposta aos mais fracos e sofredores; com sua liberdade provocativa pôs a descoberto as mazelas sustentadas pelos encarregados da religião (fariseus) e pelos colaboracionistas do império romano (herodianos).
Jesus impressionou, surpreendeu, inovou a partir da sua relação com Deus, chamado familiarmente de Abbá, que lhe conferia "autoridade" para denunciar todo tipo de poder que desumaniza.
Trata-se de uma autoridade diferente da do mundo, uma autoridade que não tem como fim exercer um poder sobre os outros, mas servi-los, devolvendo-lhes a liberdade e a plenitude de vida. Viveu totalmente dedicado, não precisamente ao imperador César, mas aos empobrecidos e excluídos do império.
E isso até o ponto de pôr em jogo a sua própria vida.

Jesus se tornou um sinal de contradição porque permaneceu absolutamente fiel a uma mensagem, a um modo de agir e a uma missão que havia recebido do Pai e que devia realizar com critérios e opções coerentes com o conteúdo do seu Evangelho.
Desde o início de sua vida pública Jesus exerceu considerável poder de sedução sobre os pobres e excluí-dos da Galiléia. Seu fascínio sobre o povo não tinha nada de improvisado, mas era fruto de anos de soli-dariedade com os simples, os doentes, os pecadores... Não tinha terras, não possuia denários de prata, não tinha poder. Vivia de maneira pobre e livre, totalmente centrado na busca do Reino de Deus e de sua justiça. A riqueza original desse sonho primordial não se “encaixou” nos esquemas dos fariseus e herodia-nos, dos sacerdotes e anciãos do povo, dos saduceus,  dos essênios ou zelotes, nem se deixou instrumenta-lizar pela instituição do Templo ou sinagoga.
Isso inquietava as instituições, políticas e religiosas, pois a presença original e crítica de Jesus ameaçava pôr por terra toda uma estrutura extremamente injusta cujas primeiras vítimas eram os pobres e excluídos.
Jesus optou por ficar do lado das vítimas.
Essa situação conflituosa de Jesus com os “podres poderes” é o resultado do confronto entre sua missão (que anuncia a justiça do Reino e as bem-aventuranças) e a realidade que não quer ouvir e rejeita a novidade  do Reino.

Além disso, o Deus que Jesus nos revela é o Deus que se faz presente no pequeno, no simples, naqueles que não tem voz e nem vez neste mundo. Não é o Deus do poder absoluto, nem o Deus que exige obediência e submissão àqueles que se apresentam como representantes  do divino.
O Deus que Jesus nos faz conhecer não é o Deus que nos complica a vida com normas e leis, nem nos impõe pesados fardos, mas o Deus que se humaniza para humanizar nossa vida. E assim Jesus nos indi-ca que só na medida em que nos fazemos mais humanos, nos fazemos mais semelhantes a Ele que, para aliviar o sofrimento humano, se comprometeu com os que sofrem, até identificar-se com eles na morte.
O Deus de Jesus é o Deus que responde e corresponde aos anseios de respeito, dignidade e felicidade que todos trazem inscritos no sangue de suas vidas e nos sentimentos mais autênticos e nobres.
O Deus Misericordioso não impulsiona ninguém a desejar poderes, por mais divinos que sejam. Ele é o Deus que só legitima a identificação e até a fusão com o destino das vítimas deste mundo.

Esta foi a principal fonte de conflitos de Jesus com os aqueles que, em nome de Deus, exerciam o poder e a dominação sobre as pessoas e sobre o mais íntimo que há em cada um: sua consciência e sua liberdade para tomar decisões na vida e expressar sua fé em Deus. É nesse contexto que os fariseus e herodianos se unem contra Ele com uma pergunta capciosa: “É lícito ou não pagar o tributo a César?”
A resposta de Jesus tem dado margem a interpretações distorcidas. De fato, Jesus acrescenta uma grave advertência sobre algo que ninguém lhe perguntou: “dai a Deus o que é de Deus”.
Jesus não põe Deus e César no mesmo nível, senão que toma partido por Deus.
Com sua resposta, Jesus propõe um princípio de validade permanente: a rejeição a absolutizar qualquer tipo de poder. César se impõe (imposto) pelo poder, que oprime e exclui; Deus não se impõe (não é imposto); faz-se dom, esvazia-se de todo poder e se aproxima de nós, se faz comunhão.
O relacionamento entre o ser humano e Deus dá-se na esfera da mais pura liberdade, lá onde as decisões são ditadas pelo amor.

Jesus denuncia a submissão dos fariseus e herodianos que carregavam consigo moedas com a imagem do imperador romano: vivem como escravos submissos a um poder que desumanizava e humilhava a todos com pesados impostos. Mas o ser humano é “imagem” de Deus e só a Ele pertence. O único absoluto é Deus. Trata-se de uma “submissão amorosa” que não se impõe (imposto), pois nos convida a entrar em sintonia com Ele, numa comunhão de vida e compromisso com os outros.
Alguns biblistas traduzem a expressão “dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” por “re-tirai de César o que é de Deus”, ou “não dai a César o que é de Deus”, ou ainda, “dai a César o que é de César, mas não lhe deis o que é de Deus”.
Em outras palavras: não entregueis a nenhum César o que é de Deus: seus pobres. Os pequenos são os prediletos do Pai; o Reino de Deus pertence aos pobres. Não se pode sacrificar a vida e a dignidade dos indefesos a nenhum poder político, financeiro, econômico ou religioso. Os humilhados pelos poderosos são de Deus e de ninguém mais. Que nenhum poder abuse deles; que nenhum César se imponha.

Enfim, numa sociedade corrupta e deformada, uma pessoa que se ajusta ao que está estabelecido e, por-tanto, não desconcerta ninguém, é uma pessoa alienada, que passa pela vida sem ser provocadora e deixa tudo como está. Só desconcerta quem, na fidelidade ao Evangelho e à causa do Reino, rompe os esquemas fechados e estruturas de poder, transgride o excesso de normas, abre novos caminhos ainda não imagina-dos.

Texto bíblico: Mt 22,15-21

Na oração: “Quem é o senhor que move nossa vida?  
                     Alimentamos diferentes “césares” em nosso coração, aos quais nos fazemos submissos: instinto de posse, busca de poder e prestígio, consumismo, obsessão por um bem-estar material sempre maior, o espírito de competição... Quando é “cézar’ que determina nossa vida, sua influência envenena nossa relação com Deus, deforma nossa verdadeira identidade e rompe nossa comunhão com os outros; nos desumanizamos...
Como seguidores de Jesus, devemos buscar nele a inspiração e o alento para viver de maneira livre e solidária.







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