Teológico Pastoral

Teológico Pastoral

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Homilia Dominical - Natal - 2016

Um Menino é a resposta de Deus às nossas perguntas


“Encontrareis um recém-nascido envolvido em faixas e deitado numa manjedoura” (Lc 2,12)

Natal: estamos em um tempo que nos fala do essencial: um Deus que se faz carne, o divino que se faz humano; o eterno se estremece diante do que é terno; o infinito abraça amorosamente a fragilidade...
Viver este mistério é viver em Deus, compreender até onde chega a loucura de amor de um Deus que se humaniza para que nos humanizemos. “A humanidade de Cristo é a humanidade vivida à maneira de Deus, ou melhor, vivida por Deus” (José Arregi).
“Deus se humanizou”: tal expressão revela que a Misericórdia de Deus significa também ternura.
Apareceu um Menino: apareceu a ternura e a doçura do Deus que salva. Na fragilidade de uma criança se esconde e se revela a grandeza divina. Uma antiga tradição religiosa afirma que a maior seriedade de Deus aconteceu quando Ele virou menino. Louca aventura amorosa de Deus!
No rosto de uma criança se faz visível a Misericórdia que desce sempre mais abaixo, que nasce no ventre da terra e se faz terra fértil.

Segundo Jacob Boehme, místico medieval, Deus é uma Criança que brinca..
É nessa atmosfera “infantil” que Deus se aproximou de nós. Não veio como um imperador poderoso nem como um sumo-sacerdote ou um grande filósofo. Deus pode ser encontrado não na estrada suntuosa do domínio e do poder, mas na estrada da doação, da partilha, da solidariedade... A única explicação da “descida” de Deus é seu “amor compassivo”. Ele mergulhou na nossa fragilidade fazendo-se uma criança pobre, que nasce na periferia, no meio de animais, deitada numa manjedoura... para que ninguém se sentisse distante d’Ele, para que todos pudessem experimentar o sentimento de ternura que  uma crian-ça desperta e sobre quem nos dobramos, maravilhados. Criança não infunde medo; todos se aproximam dela. Pequenino com os pequeninos, Deus nos faz proclamar silenciosamente:
                “Meu Deus, me dá cinco anos, me dá a mão, me cura de ser grande...” (Adélia Prado).
É a fragilidade de uma criança que ativa em nós a atitude da expectativa, da novidade, do assombro...
Cada nascimento é um sinal, um imenso milagre, uma bela promessa, um profundo chamado. Viver é milagre. Só ser já é milagre. E o maior milagre é a ternura que cuida, nutre, consola. Isso é “Deus”.

Dizia o pintor Pablo Picasso que tornar-se criança leva tempo, e poderíamos acrescentar que somente o encontro com o Deus Menino nos devolve a pureza e a inocência primordiais. Quando nos fazemos presentes junto à Criança eterna, então brota em nós o impulso para a renovação de vida, o despertar da inocência escondida, o encontro com novas possibilidades de ação que correm em direção ao futuro.
O Natal é essa ternura que ilumina a história humana, o cosmos do qual somos parte. É a confissão de que a bondade gera e sustenta a vida. É crer que tudo está eternamente movido por um pulsar profundo, criador, maior e mais poderoso que o universo, mais terno e pequeno que o coração de um recém-nascido. É a promessa de que o bem prevalecerá.
Ao recuperar o olhar de assombro e de espanto no interior da Gruta de Belém, nossa mente se abre à imaginação e ao sonho, começamos a considerar as infinitas possibilidades para ser e conviver, brota a alegria do novo, do que está nascendo a cada instante, de explorar recursos inéditos e desconhecidos.
Natal é o tempo para acolher com ternura o que é germinal, o pequeno, o que nasce nos movimentos sociais e humanitários alternativos e nos grupos eclesiais que se empenham por um mundo novo e por uma Igreja mais sintonizada com o sonho de Deus. É o momento de sair para os excluídos, para aqueles que não podem chegar até nós.

Ao entrar na gruta para contemplar o Menino-Deus, conectamos, ao mesmo tempo, com o mais profundo do coração humano, carregado de compaixão e generosidade. A bondade humana é uma faísca que pode se atrofiar, mas jamais se apagar. São necessários alguns momentos densos para que esta chama seja ativada. A vivência do Natal é um deles.
Da “Gruta de Belém” à “gruta interior”: esta é a aventura que nos leva a crescer, amar e compartilhar com os outros o dom da vida; aprender a ver nas pessoas a grande reserva de bondade, altruísmo e generosidade que carregam dentro de si; nunca conformar-nos com a injustiça e a violência, semeando cordialidade e gentileza a todos (as); e, sobretudo, ser mestres da esperança. “...porque é de infância, meu filho, que o mundo precisa” (Thiago de Mello).

O Menino Deus, em Belém, nos oferece uma maneira nova de olhar a realidade e a fragilidade de tantas pessoas. A contemplação de Jesus em seu nascimento nos ensina a contemplar a fragilidade e a exclusão
humana como uma forma de presença de Deus. Deus está entre nós como fragilidade, nos excluídos, nos pobres, nas carências de todo tipo, em cada uma de nossas limitações. Por isso mesmo, sair, descer ao encontro das carências humanas, é uma forma de peregrinação para o coração do Deus mais vivo e surpre-endente. Com os mesmos passos com que nos aproximamos da fragilidade dos que sofrem, também nos aproximamos de Deus.
A partir dessa debilidade podemos sentir que passa por nós a força de Deus, seu santo braço, que transforma, com nossa ajuda, toda a realidade.
Se Deus correu o risco de encarnar-se, de nascer pobremente e crescer como salvação a partir da exclusão deste mundo, já não há excluídos para Ele, ninguém fica fora d’Ele. E o lugar principal para a festa é ali onde Ele aparece: nos aforas, onde não há lugar, onde tudo parece esgotar-se e é condenado a crescer em meio às ameaças e às intempéries das situações humanas.

O Nascimento de Jesus é um atrevimento, uma verdadeira ousadia, uma surpresa inimaginável...; na verdade, o Natal é a manifestação do impossível que se faz possível no coração de Deus.
“Ele é o eterno Menino, o Deus que faltava; o divino que sorri e que brinca; o menino tão humano que é divino” (Fernando Pessoa).
Agora temos um Deus menino e não um Deus juiz severo de nossos atos e da história humana. Quê alegria interior sentimos quando pensamos que seremos julgados por um Deus Menino! Ao invés de condenar-nos, ele quer conviver e entreter-se conosco eternamente.

Texto bíblicoLc 2,1-14

Na oração: Que saibamos escutar a nossa criança interior
                     que clama por ser amada, acolhida, curada de tanta mesquinhez, intolerância, e indiferença.
O Natal é como um poema; nele Deus se revela como uma Criança, pois nos mostra que a vida é sempre dom, novi-dade que destrava a humanidade para expandi-la por inteira. Que o Deus Menino que vai nascer nos mostre o caminho da verdadeira beleza da vida, e a graça de nunca perdermos a alegria de ser e viver.
Deus seja louvado!
Um abençoado Natal a todos!
Pe. Adroaldo sj




Homilia Dominical - advento - 2017

O SILÊNCIO DO “HOMEM JUSTO

“José, seu marido, era justo e, não querendo denunciá-la, resolveu abandonar Maria, em segredo”

A única coisa que o Evangelho nos diz de José é que era um homem justo. Este adjetivo, de profundas raízes bíblicas, nos quer dizer que era reto, íntegro, autêntico, bom, etc..., tudo o que podemos encontrar de positivo em uma pessoa humana. O homem justo é aquele que, como Abraão, acolhe na fé o plano de Deus e com Ele colabora. José é “justo” porque adere ao misterioso desígnio de Deus, é justo porque se “ajusta” ao modo de agir de Deus, arrisca com Deus, embora os contornos do Seu Plano permaneçam obscuros e, em certos aspectos, incompreensíveis.
José se coloca, portanto, na linha das grandes figuras da história da salvação. Sua atitude é um exemplo de silenciosa dedicação ao Reino. É o homem de uma grande nobreza de coração que, no silêncio da fé, acolhe o mistério que não compreende. Ele também teve sua “anunciação”; também teve que dar seu “sim” a Deus no mistério do desconhecido.
O “justo” José viveu no dia-a-dia a fidelidade a Deus. Mateus repete três vezes que ele se levantou para fazer o que lhe fora revelado como Vontade de Deus. José soube acolher também, na obediência e no amor despojado, a missão que Deus lhe confiou.

José é o homem do silêncio; de fato, uma das coisas que mais chama a atenção é que ele não pronuncia palavra alguma em nenhum dos relatos evangélicos nos quais aparece. Diríamos que os relatos apresen-tam a figura de um homem silencioso. Sua existência está atravessada pelo silêncio. José é o homem que vive e atua no silêncio.
Mas entendamos bem. Este silêncio não se deve a que José seja um homem de caráter introvertido, isolado, fechado sobre si. Pelo contrário, trata-se de um silêncio interior, intenso, grávido de conteúdo. Precisamente o que as cenas evangélicas mais destacam é que José escuta atentamente o que lhe é anunciado e ele responde instantaneamente, com gestos decididos. Poderíamos dizer que suas ações são suas palavras e suas palavras não pronunciadas se convertem em gestos eloquentes que manifestam a grandeza de sua alma.

Nos relatos de aparição de anjo, normalmente se dá um intercâmbio de palavras entre o mensageiro e a pessoa à qual é enviado. No caso de José, no entanto, nunca há diálogo. Nos três momentos em que o anjo do Senhor aparece a José dá-se o mesmo esquema: o anúncio da mensagem e a resposta decidida de José por meio da ação. José não pede explicações nem sinais confirmadores; obedece e pronto.
Quando recebe o anúncio de que Maria estava grávida por obra do Espírito Santo, imediatamente faz o que lhe havia dito o anjo do Senhor e toma consigo a sua mulher. No caso da fuga ao Egito, o anjo, além do mais, pede a José colocar-se a caminho: pede-lhe uma prontidão que o desenraiza de seu ambiente, que o desinstala de sua própria terra para viver no estrangeiro.
Quando o anjo lhe adverte da perseguição de Herodes, imediatamente se levanta, toma o menino e a sua mãe durante a noite e se retira ao Egito. O mesmo acontece quando o anjo do Senhor lhe diz que pode voltar a Israel porque tinham morrido aqueles que buscavam tirar a vida do menino.

Os textos destacam a atitude de disponibilidade obediente e prontidão confiada de José.
Seu silêncio não tem nada de ingênuo, não é o silencio daquele que nada sabe ou não quer complicar sua vida. José está, sim, ciente de que sua esposa está grávida; está ciente que o menino está em perigo e, por isso, o leva ao Egito; está ciente de que seu filho se perdeu e, por isso, o busca. E como está ciente, tem medo. Não um medo que o paralisa, mas um medo inquietante, que o impulsiona a buscar soluções respeitosas para com sua esposa e lhe move a tomar decisões valentes, como a de emigrar em busca de um lugar onde refugiar-se. José se arrisca como resultado de uma reflexão, feita possível graças a um silêncio que escuta, valoriza e discerne.
Toda a vida de José é descrita pelos evangelistas em segundo plano. Esse saber estar na “sombra” para não “fazer sombra” a outros, esse escutar e discernir a vontade divina, essa preocupação pelo bem-estar dos demais, esse silêncio contemplativo e radical que lhe permitia aprofundar na realidade, essa prontidão na “obediência à fé” e essa disponibilidade sem fissuras à graça foram as qualidades com as quais José entrou em sintonia com Deus, dando sua contribuição decisiva ao mistério da salvação.

A figura silenciosa de José des-vela e denuncia o “palavreado crônico” que nos esvazia. Ele nos mobiliza a viver o silêncio atento e que escuta. Quando calamos e fazemos silêncio começamos a escutar a nós mesmos e a Deus, que fala silenciosamente “em sonhos”.
Há uma diversidade de silêncios. Existe o silêncio dos mortos ou o silêncio daquele que não tem nada que dizer, porque sua vida está vazia. Existe o silêncio cheio de tristeza do desamparado, que sofre, chora e perdeu toda esperança. Existe o silêncio tenso que se estabelece quando duas pessoas que não se amam se veem obrigadas a estar em um mesmo lugar. Existe o silêncio respeitoso diante de um enfermo ou diante de uma tragédia; existe o silêncio cheio de amor que brilha no olhar daqueles que se amam. E existe o silêncio daquele que escuta atentamente o que o(a) amado(a) tem a lhe dizer.
Sem dúvida, este último silêncio é o que melhor caracteriza a José de Nazaré. Os Evangelhos o apresen-tam como um homem sempre pronto a escutar a voz de Deus que fala através dos acontecimentos de sua vida e da vida daqueles que foram confiados aos seus cuidados.

Carecemos do silêncio transformador neste nosso mundo. O ruído inunda as ruas, os lugares de trabalho, as casas e até os corações. O ruído atordoa, tem efeito devastador, provoca a revolta, agressividade e um estado de ânimo convulsionado. Com o barulho, o espírito humano se acomoda, se anestesia, se dopa. O funcionamento normal do cérebro fica debilitado. A pessoa não sente, não pensa, não tem serenidade para decidir. Todas as expressões de vida se atrofiam. A criatividade seca, os sonhos desaparecem e o ser humano torna-se incapaz de escutar a música harmoniosa de toda a Criação...
Num contexto de ruídos atrevidos, tanto na cidade como em nossos lugares de “repouso”, torna-se mais do que necessário uma “cultura do silêncio”, que permita re-descobrir o nosso próprio interior, escutar a voz dos anjos indicando os melhores caminhos a serem trilhados.
Tony de Mello nos diz: “O silêncio não é ausência de som, mas ausência de Ego”.
A carência do silêncio em nossa vida nos faz seres superficiais. Com efeito, a cultura pós-moderna decre-tou o fim do silêncio: vivemos imersos nos mais diferentes ruídos. E o silêncio, por sua vez, está se vin-gando de nós, criando vazio, superficialidade, palavras sem sentido, já não sabemos quem somos, para onde andamos e o que queremos...
É indispensável “fazer silêncio” para entrar em contato com a realidade, sobretudo para abrir espaço ao Outro dentro de nós, para acolhê-Lo, para ouví-Lo e entrar em sintonia com sua Vontade.
Nos murmúrios interiores do coração ali encontramos os sinais da presença viva de Deus.

Texto bíblicoMt 1,18-24

Na oração: Durante a contemplação devemos deter-nos
                   particularmente na figura de José. Ele, no seu silêncio, teve seus pensamentos próprios, suas preocu-pações, suas perguntas dilacerantes e suas dúvidas angus-tiantes. Mas Deus nunca deixou de atuar no meio das suas noites, dúvidas, provações. E, no momento oportuno, o libertou dos seus medos e lhe deu a conhecer sua Vontade.
- Neste Advento, reservar momentos de silêncio e preparar-se para acolher Aquele que, no silêncio pleno, vem fazer morada em seu interior.



terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Homilia Dominical - 11 de Dezembro de 2016

ADVENTO: olhos e ouvidos expansivos

“Ide contar a João o que estais ouvindo e vendo...” (Mt 11,4)

A vivência cristã depende da sensibilidade e enquanto esta sensibilidade não for evangelizada não pode-mos ter certeza de atuar evangelicamente na vida.
É preciso “evangelizar os sentidos” para que eles encontrem seu lugar insubstituível na experiência de fé e poder reagir diante da realidade com uma sensibilidade nova, diferente, transformadora, convertida.
E só podemos descobrir o “lugar e o sentido” dos sentidos através do confronto com a “sensibilidade de Jesus”. O Advento é tempo favorável para expandir os sentidos e assim ser presença diferenciada e comprometida no contexto onde vivemos.

Vivemos numa cultura que nos assalta por todos os sentidos, através de técnicas minuciosamente estuda-das para invadir-nos e instalar-se nas dimensões mais profundas de nossa afetividade, de tal maneira que vejamos e escutemos a realidade segundo seus próprios quereres e interesses.
Com isso, os sentidos estão ficando atrofiados e nos lançamos desesperadamente em busca de compensa-ções virtuais. Nossos medos estão impossibilitando os sentidos ocuparem o lugar que lhes corresponde em nossos comportamentos e atitudes.
Nossos ouvidos, assaltados pelos ruídos virtuais, se desconcertam ao descobrir o silêncio. Perdemos a sintonia dos sons naturais. É exagerado pedir que distingamos o cantar de um pássaro. A contemplação auditiva não registrada em aparatos eletrônicos nos parece uma perda de tempo.
A visão que, sem dúvida, é o sentido por excelência e o mais estimulado, é, ao mesmo tempo, o mais manipulado e violentado pelo excesso de imagens virtuais. Nosso campo de visão é cada vez mais reduzi-do, unicamente ampliado pelas telas digitais.

Talvez a pior enfermidade que hoje padecemos seja a de ter perdido a capacidade de assombro e de agra-decimento, ou seja, a capacidade de abertura aos outros e ao Outro. Talvez hoje, mais do que nunca, preci-samos de uma ascese que purifique nossos sentidos de tantos estímulos que invadem nossa intimidade, nos intoxicam, nos aprisionam e deturpam nossa sensibilidade, impedindo-nos de perceber como os cegos recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e os pobres são evangelizados” (vv. 5 e 6).
Somente mediante uma acolhida contemplativa do Evangelho podemos transfigurar nossos sentidos e converter nossa sensibilidade. À medida que vai se realizando esta conversão de nossa sensibilidade, nós nos fazemos capazes de estar presentes no mundo à maneira de Jesus de Nazaré, em sua terra e com sua gente.

Advento é tempo propício para re-educar os sentidos, de maneira a torná-los mais oblativos e expansivos.
Educar nossa sensibilidade “ao estilo de Jesus” implica empapar-nos de sua forma de ser e de sentir, de vibrar com tudo aquilo que lhe fazia vibrar, de rejeitar tudo aquilo que Ele rejeitava, e assim reagir frente à realidade e às pessoas do mesmo modo que Ele reagia. Buscando e desejando a identificação com Jesus, nossos sentidos aprendem d’Ele a ter ternura, visão, escuta, sabor...
O mestre de Nazaré desenvolveu a sensibilidade no seu sentido mais belo. Nele, ela se tornou mais do que uma característica de sua personalidade, mas uma arte poética. Era criativo, observador, detalhista, perspicaz, arguto, sutil. Destilava prazer nos pequenos eventos da vida e, ainda por cima, conseguia perceber os sentimentos mais ocultos naqueles que o cercavam. Conseguia ver encanto numa pobre viúva e perceber as emoções represadas numa prostituta. As dores e as necessidades dos outros mexiam com as raízes de seu ser. Conseguia mesclar a segurança com a docilidade, a ousadia com a simplicidade, a autoridade com a capacidade de apreciar os pequenos detalhes da vida. Por ser um exímio observador, o mestre da sensibilidade se tornou um excelente contador de histórias e parábolas.

Jesus não idealizou a realidade; Ele a contemplava como o Pai a contemplava, e se aproximava dela como o Pai mesmo se aproximava. Seu modo de olhar e sentir a realidade permitia-lhe captar a maneira de atuar do Pai, para poder unir-se a Ele em seu trabalho criador. “Meu Pai trabalha sempre, e eu também traba-lho” (Jo 5,17).
Com sua presença inspiradora e através de palavras e gestos compassivos Jesus trazia à luz a vida nova escondida e atrofiada entre os escombros da enfermidade e da exclusão. Ele revelava-se como Aquele que era o “Esperado”, Aquele que vinha aliviar o sofrimento humano, destravar a vida e abrir um horizonte de esperança aos pobres e doentes.
A contemplação e o seguimento de Jesus não nos transformam a fundo se não atravessa todas as camadas de nosso ser, começando pela nossa sensibilidade; em outras palavras, a transformação do coração exige uma renovação de nossa sensibilidade.
O(a) seguidor(a) de Jesus, com seus sentidos cristificados, não fugirá dos desafios e dos dramas da realidade, mas ali se revelará presente de maneira inspirada, buscando entrar em sintonia com Aquele que destrava todas as amarras que oprimem e desumanizam.
Olhar e escutar a partir de Jesus, olhar e escutar como Jesus, olhar e escutar a partir dos olhos daqueles que sofrem... essa é a dinâmica própria do tempo do Advento. Trata-se de um convite a iluminar nosso olhar e afinar nossos ouvidos, às vezes muito apagados pela mediocridade de nossa vida; outras vezes opacos pela falta de esperança em nossa capacidade de levar adiante a missão que Cristo nos confia.
O olhar e o escutar não são atitudes neutras, senão que há fatores que as limitam: o lugar a partir de onde se olha e se escuta condiciona o que se vê e o que se ouve. O olhar e o escutar estão, muitas vezes, marcados também pelas ideias e visões distorcidas que temos da realidade.

Jesus nos convida, no Evangelho de hoje, a fazer um exercício especial da visão e da audição; o que Ele nos pede é expandir os sentidos para entrar em sintonia com as pessoas que nos cercam, para perceber a Presença do Invisível, que se revela ao mundo como mistério e transparência.
Há um modo de ver, de ouvir, de sentir e de pensar que nos entorpece e nos isola em nosso pequeno mundo estreito e autocentrado, enquanto que há outro modo que nos abre e nos lança ao mundo, e que o vai revelando como presença e transparência de Deus. Os sentidos devem ser portas e janelas abertas que nos fazem viver na atitude de contínua “saída”.
Jesus insiste: quem não está desperto, quem não abre bem os olhos, quem não afina o ouvido..., o mistério divino lhe ficará oculto. No descobrir, no “ver” as pessoas às quais costumamos excluir de nosso campo visual cotidiano, começa o vislumbre, a visibilidade de Deus entre nós... É aí onde encontraremos sua pegada. É aí onde nos “esbarramos” n’Aquele que esperamos neste Advento.

Texto bíblicoMt 11,2-11

Na oração: Os sentidos, cristificados na contem-
                     plação, nos impulsionam em direção ao outro e nos fazem acreditar na beleza e dignidade escondidas na fragilidade da condição humana.
- Mergulhar na realidade que nos cerca, por meio dos sentidos bem abertos e evangelizados, é deixar estremecer de vida divina a fragilidade de nossa condição humana.
- Na intimidade com Deus, ampliar bem os sentidos para tornar-se contemplativo no modo cotidiano de viver.


quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Homilia Dominical - Dezembro - 2016

ADVENTO: modo criativo de esperar


“Por isso, também vós ficai preparados! Porque, na hora em que menos pensais, o Filho do Homem virá” (Mt 24,44)

Em cada ano, no tempo do Advento, a liturgia da Igreja nos mobiliza a esperar. Nem sempre caímos na conta que tenhamos a Quem esperar. Então, nos dispersamos “esperando algo”, vivendo a lenta e inevi-tável fila das esperas.
Como seres humanos, fomos feitos para esperar: esperar um filho, esperar um trabalho, esperar o resul-tado de um exame médico, esperar que as coisas melhorem, esperar que saia o sol… Trata-se de uma sucessão interminável de esperas, algumas vezes infrutíferas, indesejadas e angustiosas, outras vezes sur-preendentes, plenificantes… Às vezes esperamos sem saber muito bem o quê ou quem esperamos, como os dois personagens do filme “Esperando Godot”, que nunca souberam a quem esperavam, nem por que esperavam, nem se, efetivamente, chegaria o esperado Godot.
Outras vezes, a espera se vê realizada, mas o resultado da mesma é tão pífio, tão frustrante, que os “esperantes” terminam por pensar se valeu a pena tanta mobilização. Existem também esperas doentias, que provocam ansiedade, medo e nos paralisam; esperas centradas em nós mesmos.
Esperar, para quê? a quem? de onde nasce a necessidade de esperar?

Vivemos tempos carregados de “pressas” que nos mantém tensos; queremos resultados imediatos e nos angustiamos na impaciência. Mas a vida cristã precisa de muito Advento, muita espera e paciência. No interior de nossas entranhas brota uma voz serena: “Dá prá esperar?”
Só quem é movido a “sentir o tempo” de modo novo pode habitá-lo com intensidade em todas as etapas da vida. Cada momento esconde sua pérola e é muito instigante poder descobrí-la.
A vida cristã é uma vida de espera, mas se trata de uma espera carregada de esperança. Esperar é uma forma de viver, um hábito de vida. Nós somos o que esperamos. “Só quem espera pode ver”.
Estamos no tempo litúrgico da espera, que nos motiva a esperar, mas a esperar com esperança, sabendo a Quem esperamos; mais ainda, sabemos que, Aquele que esperamos, já chegou, que já está entre nós, que as promessas esperadas já estão cumpridas. Deus vem a nós e a nossa espera ativa é a nossa maneira de ir até Ele. Aquele que esperamos já está presente, dando um sentido de eternidade à nossa espera.
Espera que nos faz criativos, intuitivos, sonhadores... Espera que nos faz sair de nós mesmos, abrir-nos à realidade que nos cerca e crescer em comunhão com tantos que nos esperam. Espera que nos descentra.
“Diga-me o que você espera e vou lhe dizer quem você é”. A espera revela nossa identidade, aponta para onde está nosso coração.

O “que” ou “quem” esperamos? Se não sabemos o que esperamos, a vida perde sabor e sentido; quem não espera, não busca, não amadurece. No supermercado da vida há muitas ofertas que pretendem preen-cher o vazio da espera, mas não tem consistência, não nos saciam, não nos preenchem, e não nos indicam um horizonte de sentido. O maior inimigo da espera é a dispersão, ou seja, apego ao imediato e à rotina da vida: “comer, beber, casar... como nos tempos de Noé”, Vivemos tempos de dispersão, cativados pela mídia, pelas ofertas alucinantes... Isso corrói nossa interioridade, nossa visão se atrofia e o horizonte fica obscurecido. A espera vigilante implica ampliar o olhar para além dos nossos pequenos interesses.
Advento é tempo propício para ampliar a visão. Deus não criou as fronteiras; podemos olhar mais além, lançar por terra os limites inventados, desfazer os muros que nos mantém numa vida normótica e repetitiva.
A espera vigilante pede um olhar de longo alcance e, ao mesmo tempo, um olhar que capta os pequenos sinais da Presença d’Aquele que sempre está vindo, no cotidiano da vida.
Na espera corremos dois riscos: fixar-nos somente no horizonte e aguardar vindas extraordinárias, fora do normal... desviando o nosso olhar das vindas d’Aquele que se faz presente na simplicidade da vida.
Outro risco é ter uma visão atrofiada, limitada ao cotidiano da vida e perdendo-nos na confusão de sinais e vozes que daí brotam. É preciso integrar os dois movimentos. É preciso ter um horizonte de sentido que nos ajude a discernir e distinguir tais sinais.
Do cotidiano aos largos horizontes (amplitude de visão e de vida) e dos largos horizontes ao cotidiano (dar sentido ao nosso chão cotidiano). “Não ter medo do máximo e caber no mínimo: isso é divino”.

Advento não é aguardar Alguém ausente; mas despertar para se fazer presente Àquele que está sempre presente. Esperar é “estar acordado”, no sentido de estar atento e também no sentido musical de “estar afinado”, sintonizado com a Presença que se “des-vela” sempre inesperada, surpreendente e provocativa.
Para dar lugar Àquele que vem sem cessar, é preciso alargar espaço em nossas vidas, expandir nosso coração, aliviar nossas agendas e realizar gestos de serviço que nos fazem crescer em comunhão.
A espera de Alguém desperta nossa sensibilidade para perceber que Aquele que esperamos já está presente; nós é que estamos cegos e surdos aos sinais e vozes de sua presença.
O convite de Jesus a viver vigilantes é um chamado a refazer nossa leitura dos acontecimentos, a aprender a lê-los a partir do amor que quer abrir passagem em nós.
Não estamos simplesmente “esperando Godot” para entreter o tempo e a vida. A espera não se reduz à espera mesma: ela tem conteúdo. O Salvador não cessou de vir; vem diariamente a nossos mundos (família, trabalho, relações, descanso...), vem para dar à nossa vida a profundidade e largura de seu amor, para que a Criação inteira recupere a beleza, a harmonia e a liberdade que desfrutava quando saiu das mãos do Criador.

A maneira de nos situar na vida muda quando ansiosamente esperamos Alguém: nosso coração se dilata e a vida se torna mais leve. Aquele que esteve, está e estará sempre presente, não vem para complicar nossa vida. Quantas pessoas vemos com o rosto sombrio, como se acreditassem que já não lhes aguarda nada novo, como se em suas vidas tudo estivesse pré-determinado, sem nenhuma possibilidade de mudança!
Advento quer abrir uma brecha naquilo que já conhecemos e sabemos para preparar-nos para receber a força incomparável de uma alegria que quer alcançar nossas vidas.
Esperar nos faz assumir a atitude de sentinelas que, numa posição elevada, é capaz de ler a realidade, vislumbrar o novo e assumir atitudes coerentes.
É de dentro das circunstâncias que atravessamos que Deus não cessa de nos buscar e de nos surpreender.

Texto bíblicoMt 24,37-44

Na oração: A espera do Advento é mobilizadora,
                     pois ativa nossas melhores energias e desata ricas possibilidades latentes em nós.
Deus vem oferecer-nos infinitas possibilidades de viver de outra maneira.
- O que espero no início deste novo tempo litúrgico: esperar atrofiado, rotineiro... ou esperar criativo e ousado?




terça-feira, 15 de novembro de 2016

Novena de Madre Clélia


 
1 - O chamado a Perfeição e à Santidade
         Dir.: Madre Clélia, movida pelo grande zelo de sua missão de fundadora e mãe espiritual, não se cansava em exortar suas filhas para que trabalhassem sem cessar e incansavelmente na busca da perfeição e da santidade. Para ela santidade é dom, é uma vocação ao qual Deus chama e convicta desse privilégio que Deus concede a alma, exorta as Irmãs a percorrerem rapidamente o caminho da santidade, uma vez que, como Apóstolas, devem a Deus uma correspondência de amor sem reservas. Explica que o amor consiste no sacrifício e na virtude e aconselha as Irmãs a serem generosas e a confiarem no Coração de Jesus que não se deixa vencer em generosidade.
      
                Voz 1.: Para Madre Clélia, a santidade e a perfeição consistem em uma obra íntima e escondida, realizada no interior da alma e na profundidade da consciência, onde só Deus conhece realmente os esforços feitos, e que se conquista com a humildade e a docilidade à vontade de Deus. Para que se possa conseguir um progresso e realizar o trabalho de santificação, é necessário que se tenha uma grande “estima da própria alma” que é a habitação e templo de Deus. Exorta sobre a necessidade de vigiar sobre si mesma, para estar sempre na presença de Deus e realizar um “continuo esforço sobre si mesmas”.
                Voz 2.: Afirma que a perfeição consiste no desapego, e o fruto do desapego é o próprio Jesus Cristo, com todas as alegrias e bens, pois quando se possui Jesus, possui-se o mundo todo. Em vários de seus escritos insiste que para ser santa é necessário “conformar-se à vontade de Deus”, estar livre de tudo e viver totalmente voltada para a glória de Deus, num continuo empenho, movida por um nobre entusiasmo que disponha a vontade a cooperar com a graça. Pois se Deus tem o centro de nossas vidas, tudo o mais encontra seu devido lugar.
                Voz 3.: Nossa Madre também apresenta os obstáculos no caminho da santidade. Para ela, os maiores obstáculos são os que fazem parte da nossa própria natureza. Fala sobre a necessidade do autoconhecimento, para que se possa realmente combater as más inclinações e considera a exagerada estima de si mesma como o maior perigo para o verdadeiro progresso espiritual, pois falsifica o que somos na realidade e consequentemente impede-nos um trabalho real e profundo sobre nós mesmas. Apresenta quatro vivências importantes para superar estes obstáculos, “a desconfiança de nós mesmas, a confiança em Deus, o exercício e a oração” realizadas como fruto “do santo amor” que deve penetrar em todos os ângulos da alma.
Exortações de Madre Clélia...
Voz 4.: “Não busques molemente a conquista do teu aperfeiçoamento; coloca todo o ardor e o nobre entusiasmo de que és capaz. Leva a chama do santo amor a todos os ângulos e a todas as penetrações da tua alma, para não deixar subsistir nada que não seja voltado para a glória e honra de Deus.
Coloca neste trabalho os esforços generosos e constantes da tua vontade. Esquece o pouco bem que poderias ter feito na tua vida passada, e volta-te para a santidade que ainda não conquistaste.
Que as provas não te assustem. Atira-te cega entre os braços amorosos de Jesus, e com Ele darás passos gigantescos no caminho da perfeição.
Recomendo-te o estudo do Catecismo e das Constituições... Fecho-te na chaga do Sagrado Lado de Jesus, no qual te deixo, a fim de que tu possas aprender o que ainda não conheces, isto é, a humildade.” (M.g., II, p. 180).

Exortações do Papa Francisco...
Voz 5.: “Ser santo não é um privilégio de poucos, como se alguém recebesse uma grande herança. Todos nós recebemos a herança de nos tornarmos Santos no Batismo. Ser santo é uma vocação para todos. Todos nós somos chamados a percorrer o caminho da santidade e o caminho que leva à santidade tem um nome e um rosto: Jesus Cristo. No Evangelho, Ele nos mostra a estrada das Bem-Aventuranças. A santidade se faz no testemunho cristão nas ocupações de cada dia e no estado de vida em que se encontra. O que se espera é que se cumpra com honestidade e competência o trabalho, oferecendo tempo ao serviço dos irmãos. Ali onde você trabalha você pode se tornar santo. Como respondemos até agora ao chamamento do Senhor à santidade? Tenho a vontade de me tornar um pouco melhor, de ser mais cristão, mais cristã? Esta é a estrada da santidade.”

2 - Purificação e retidão interior: meios para chegar à santidade
                Dir.: Nossa Madre dedica muitas páginas de seus escritos à purificação e fala sobre ela em diversos modos, como o sofrimento que purifica a alma, como a penitencia que devemos fazer para que Deus nos purifique como esforço pessoal imposto pela própria boa vontade de se libertar e se corrigir. E isso ela nos ensina também com a própria história de vida. Fala e ensina a suas filhas o que aprendeu através da experiência. Quanto lutou e sofreu para manter acesa a chama que ardia em seu coração, para ver o Instituto florescer, para ver suas filhas santas, para salvaguardar a integridade do Carisma confiado a ela. Sua estreita união ao Coração aberto na cruz a levou ao ápice da entrega ao amor e por amor.
                Voz 1.: Para ela “Deus Só” deve ser o motivo de toda a existência humana no seu dia a dia; e ensina que isto só se consegue através de um continuo exercício de purificação interior. Demonstra a necessidade de tornar-se criança, para poder entrar no Reino dos Céus. Para conseguir uma verdadeira transformação interna, é preciso uma mudança radical em nossas intenções e motivos existenciais para que só Deus, só Jesus seja a única meta, o único objetivo de todas as nossas intenções e aspirações.
                Voz 2.: É um caminho que não se consegue de um dia para o outro; é um caminho que precisa ser percorrido com paciência e muita calma, procurando, no dia a dia, viver de acordo com os santos desígnios de Deus, acompanhado por uma atitude firme e resoluta de uma constante busca e aproximação das coisas que possam conduzir à pratica do bem e das virtudes, através de um empenho pessoal, permitindo que só Deus habite em nossa alma.
                Voz 3.: Para a Madre, é necessária uma atitude firme e resoluta que só se consegue através da educação da própria vontade em colaboração com a graça de Deus. E a vontade é educada e fortalecida mediante a purificação interior e retidão de intenções, que também conduzem a uma disposição interna de se auto avaliar, em todos os níveis e dimensões, nas relações com o próximo, nos próprios sentimentos e afetos, nos pensamentos, nas atividades e ações. Explica e orienta sobre a necessidade de executar todas as ações com um único pensamento: Tudo deve ser feito e realizado para a maior glória de Deus.
                Voz 4.: A reta intenção é o caminho mais seguro para atingir um perfeito abandono em Deus. Quando Clélia fala da retidão e intenção, é clara e explicita: entrega a Deus “teu coração sem nenhum temor”, “oferece-te a Deus em sacrifício, no silencio e na paz do espírito”. E aponta a retidão e a purificação interior como base para uma vida vivida com humildade, recolhimento, caridade e perfeito cumprimento da vontade de Deus.
Exortações de Madre Clélia...
Voz 5.: “Ouvi, filhas: como pelos frutos se conhece a árvore, considerai um pouco as amizades e as relações que cultivais, para deduzir se elas são santas ou vãs. Se das vossas relações tirais algum bem espiritual, elas serão um meio assaz vantajoso para vós e para os demais; do contrário, serão apenas uma perda de tempo e uma ocasião de arrefecimento espiritual, quando não de pecado. (M.g., I, pág. 87). Coragem e confiança no Santíssimo Coração de Jesus, e tudo estará de acordo com os divinos desejos. Procura retificar tudo o que fazes. Esforça-te para que em teu coração não haja nenhum rancor. Faze o bem a quem te possa parecer antipática. Afasta da tua mente,... todo pensamento que despertaria revolta no teu coração. Recorda-te que tudo em ti foi consagrado a Deus; e... ai! de ti se ousares profanar a menor parte de ti mesma”. (M.g., I, pág. 149).

Exortações do Papa Francisco...
             Voz 6.: “Quando nos apresentamos a Jesus não é necessário fazer longos discursos. Bastam poucas palavras, mas que sejam acompanhadas da plena confiança na sua onipotência e na sua bondade. Confiar-nos à vontade de Deus significa de fato confiar na sua infinita misericórdia. A graça que age em nós não busca o sensacionalismo. Ela se move com discrição e sem clamor. Para medicar as nossas feridas e nos curar no caminho da santidade essa trabalha modelando pacientemente o nosso coração sobre o Coração do Senhor, de forma a assumir-lhes sempre mais os pensamentos e os sentimentos. Pensemos em nós, em nossas misérias… Cada um tem as próprias. Pensemos com sinceridade. Quantas vezes as cobrimos com a hipocrisia das “boas maneiras”. E justamente então é necessário estar sozinhos, colocar-se de joelho diante de Deus e rezar: Senhor, se queres, podes purificar-me!”.

3 - Oração: edificar na própria alma uma cidade de paz
                Dir.: A serenidade e a paz de espírito são apresentadas, por Madre Clélia, como meios indispensáveis para que uma alma possa trilhar o caminho da perfeição. Orienta e exorta as Irmãs a manterem a paz e a serenidade de espírito, apesar das lutas e dificuldades, pois uma alma perturbada dificilmente conseguirá um progresso na virtude e na vida espiritual. Ela fala sobre a necessidade de realizar um esforço pessoal, para que se possa chegar a esta paz interior, procurando “edificar na própria alma uma cidade de paz” e experimentar as moções da graça, que age no silencio e na tranquilidade do próprio ser. Aconselha a colocar, antes de tudo, uma “sentinela de paz” sobre os sentimentos, para habituar-se e dedicar-se è vida de oração, à pratica das virtudes e o recolhimento.
                Voz 1.: O recolhimento é necessário para sentir a voz de Deus que fala no interior da alma, bem como para que possa permanecer na presença de Deus. É um caminho a percorrer, um estado de alma de verdadeira disponibilidade à ação da graça e do Espírito Santo. A Madre reconhece esta necessidade, e ao mesmo tempo, sabe das dificuldades que se enfrenta para chegar a este estágio e aconselha experimentar, um pouco por vez, a deixar as “distrações” e a “passar alguns instantes de recolhimento e de oração diante de Jesus”, para habituar-se a fazer silencio dentro de si mesma, para deixar-se guiar pelo Espírito de Deus que esta sempre disponível a “inundar a alma de luz e de paz”.
Voz 2.: Experimentai um pouco, filhas, separar-vos das distrações mundanas e passar alguns instantes de recolhimento e de oração diante de Jesus Sacramentado, e vereis quanta luz resplandecerá em vossa inteligência, quanto alívio e quanto conforto provará vossa alma! (Mg., I, pág. 84). Em nossas igrejas, Jesus Cristo nos espera, nos chama, convida-nos a pedir-lhe com confiança tudo o que queremos, e promete escutar-nos. E nós, filhas, como... podemos dizer que entramos no seu templo e ouvimos sua voz, se não o fazemos com verdadeiro espírito de fé...? (M.g.,I, pág. 113)

                Voz 3.: Para conseguir o verdadeiro espírito de recolhimento é necessário um verdadeiro espírito de fé, que para Clélia, deve ser uma constante na vida da Apóstola, quando se está na Igreja, rezando, e quando se executam as mais simples ações do dia a dia, para que se possa permanecer em atitude de recolhimento. Para ela, “dissipar-se o dia todo e recolher-se na oração” são duas práticas incompatíveis. A comunidade religiosa é um santuário doméstico, lugar onde também se está aos pés de Jesus, como Maria de Betânia. Um ambiente físico, cuidado com zelo, permite a Apóstola estar mais “unida a Deus no silêncio e na paz”.
Exortações de Madre Clélia...
Voz 4.: Fazei de tal maneira que vossa vida seja escondida em Deus com Jesus. Quando se está escondida em Deus com Jesus, se está em companhia de seus santos exemplos, de suas máximas adoráveis, de seu Coração tão humilde; e em tal companhia, quem não será humilde? Quando Jesus aparecer em sua glória, então, também vós, ó filhas, resplandecereis com Ele. Porém, atualmente, deveis estar escondidas como Ele no presépio, como Ele na sua morte. Portanto, para nós, nem louvor, nem glória neste mundo. Nada desejemos de fato. Desejemos incessantemente não aparecer senão com Ele quando... Se mostrará no esplendor infinito da sua glória... (M. g., II, pág. 104).

Exortações do Papa Francisco...
             Voz 5.: “A oração não é uma varinha mágica. Ela nos ajuda a conservar a fé em Deus e a nos entregar a Ele mesmo quando não compreendemos a sua vontade. Nisto, Jesus, que rezava tanto, é um exemplo para nós. Temos necessidade de rezar sempre, sem jamais esmorecer. Portanto, não se trata de rezar às vezes, quando ‘estou a fim’. Não, Jesus diz que é preciso rezar sempre, sem cessar, rezar, altera todas as perspectivas. A oração muda-nos o coração. Faz-nos compreender melhor como é o nosso Deus. Mas para isso é importante falar com o Senhor, não com palavras vazias, mas falar com a realidade.”



4 - Espírito Santo: Mestre interior
                Dir.: Para percorrer o caminho da santidade, é necessária uma luz especial do Divino Espírito Santo, pois sem a Sua luz é impossível sentir-se atraída pelos mistérios de Deus presentes na alma humana. Madre Clélia aconselha invocar o Espírito Santo que é “sabedoria divina” que “ilumina a alma e a inteligência”, conduzindo-a a percorrer o caminho da santidade que conduz a glória eterna. Aconselha a pedir ao Espírito a sabedoria cristã - que é vida e paz da alma, mestra, guardiã e diretriz das virtudes - que nos guie como guiou os santos, pois é ela quem nos indica o caminho e nos propõe os meios para atingi-lo.
   Voz 1.: A Madre apresenta o Divino Espírito Santo como o “consolador das almas”, e aponta as maravilhas que operou na alma de Maria Santíssima, apresentando-a como modelo de disponibilidade, procurando em tudo a perfeição, pois o Espírito age em nós e nos mostra a direção a seguir, de tal modo que “fazer as coisas negligente e imperfeitamente é faltar-lhe o respeito”. Não podemos deixar passar inutilmente os momentos da graça, pois cada inspiração é um ato da bondade de Deus, que nos assiste a cada instante.
Voz 2.: Deus nos visita todo dia com tantas luzes, com tantas inspirações de sua graça, com santos ensinamentos, com boas leituras, com santos exemplos, com os bens e os males que nos envia: uns para fazer sentir sua bondade; outros, para nos lembrar de sua justiça. É coisa digna de lágrimas não discernir estas graças, e torná-las inúteis. Oh! minhas filhas, como somos dignas de compaixão! Que desgraça é a nossa por frequentemente ter desconhecido as visitas do Senhor!” (M.g., I, pág. 56).
Voz 3.: Com suas palavras e seu testemunho de vida, Clélia Merloni nos ensina a não colocar resistência a ação da graça, mas ter sempre “uma vontade resoluta” de agir sempre sob o seu divino impulso. Ela fala da necessidade de se examinar sobre a correspondência ou não às graças concedidas por Deus através de tantos meios e alerta sobre os perigos da infidelidade que endurece o coração e nos faz dar mau exemplo e contra testemunho. Usa como exemplo João Batista, o precursor de Jesus e explica, com maestria, o que acontece no interior da própria alma, quando Jesus se faz presente, ilumina a mente e move o coração, quer seja por meio de uma moção interior, ou de um gosto pela virtude; é como uma voz secreta e poderosa que nos apresenta “o caminho, a verdade e a vida” e nos convida a seguir.
Exortações de Madre Clélia...
Voz 4.: Se invocares o Espírito Santo, que é... Sabedoria divina. Ele virá a ti, e encher-te-á com sua luz. Quando sua santa luz iluminar tua alma e inteligência, então, sentir-te-ás estimulada, induzida a percorrer o caminho da santidade, e tudo o que te rodeia, na natureza, parecer-te-á lama e podridão. A sabedoria cristã é bela aos olhos de Deus, pela inocência da vida que nos ensina, pela retidão e candor das intenções que nos inspira; bela aos olhos das pessoas que não podem negar-lhe sua estima, e às quais ela faz amar a religião; bela em si mesma, pela sua nobre simplicidade, pela nobreza de seus sentimentos, pelas grandes virtudes que inspira e pela glória eterna a que nos conduz. (M.g., I, págs. 16-17).

Exortações do Papa Francisco...
             Voz 5.: “O Espírito Santo é aquele que move a Igreja. É aquele que trabalha na Igreja, em nossos corações. Ele faz de cada cristão uma pessoa diferente da outra, e de todos juntos faz a unidade. O Espírito Santo é aquele que leva adiante, escancara as portas e convida a testemunhar Jesus. O Espírito Santo é aquele que nos impulsiona a louvar a Deus, nos induz a rezar: ‘Ele reza, em nós’. O Espírito Santo é aquele que está em nós e nos ensina a olhar para o Pai e dizer-lhe: Pai. Ele nos liberta da condição de órfão para a qual o espírito do mundo quer nos conduzir. O dom do Espírito Santo foi concedido em abundância à Igreja e a cada um de nós, para podermos viver com fé genuína e caridade operosa, para podermos espalhar as sementes da reconciliação.”



5 - Oração e união com Deus
Dir.: A oração ocupa um lugar de destaque na vida de Madre Clélia. Para ela, nosso ser deve estar em contínua prece, uma prece ininterrupta, onde todos os afetos e sentimentos, raciocínios e juízos, sejam unicamente para Deus, com Deus e em Deus. Exorta com insistência suas filhas, para que peçam a Deus o dom da oração, convicta do seu poder e da força da voz de Deus na alma. Para ela Jesus é o único Mestre, Mestre que, em “Um só dia” de instrução, instrui muito mais do que todas as escolas dos sábios. Pede a Jesus que fale sempre à tua alma. Asseguro-te, minha filha, que sua voz te instruirá mais em um só dia, do que as escolas dos sábios em muitos anos. Não hesites mais, minha filha, em recolher santamente tua mente e teu espírito, conservando-te na presença de Deus.”
                Voz 1.: Orienta ainda para que mantenham uma contínua união com Deus, exortando-nos a rezar sempre, pois Jesus se comunica à nossa alma, à medida que esta se comunica com Ele na oração. Fala da necessidade da oração para que a alma possa desempenhar bem a própria missão. A oração é sempre necessária. Nos momentos de dificuldades ela nos prepara para superar os sacrifícios pequenos e grandes que poderão surgir. Através da oração, Deus mesmo se faz a nossa força e sua presença nos concede tranquilidade e paz.
                Voz 2.: O espírito de oração deve conduzir toda a vida e todo o nosso ser, a tal ponto que nosso coração seja o santuário do Senhor. Em matéria de oração o importante é “saborear o Senhor” e esta é a finalidade da meditação que nada mais é do que “estar com o Senhor”. A Madre cita o exemplo de Santa Teresa que através da oração pode viver em sua vida a “confiança em Deus, o amor à pobreza e a prática das virtudes”, mesmo nos momentos de aridez e desolação foi perseverante e não desanimou de buscar o Senhor. Clélia nos ensina a cultivar o “jardim do nosso coração”, regá-lo com o orvalho da oração para que nasça a semente que Deus lançou na alma. De fato, nossa vida Consagrada não tem razão de ser se não buscarmos continuamente o Rosto do Senhor, que nos chamou para “estar com Ele”. A nossa missão, nossas obras e todos os trabalhos que realizamos são fecundos à medida que estão enraizados em Deus.
                Voz 3.: A oração é tão significativa para Madre Clélia, que está disposta a sacrificar a própria vida para que suas filhas obtenham “a graça de uma perfeita união com Deus”. Ela faz referencia aos vários tipos de oração: “agradecimento, adoração, louvor”, e exorta para que amemos a Deus por todos aqueles que não o amam. Aconselha a exercitarmo-nos na contemplação da bondade Divina, fruto da paz e da tranquilidade interior, como resultado da manifestação da vontade de Deus.
Exortações de Madre Clélia...
Voz 4.: Procura cultivar quanto puderes as almas a ti confiadas, e lembra muitas vezes que a alma é semelhante à terra: tem necessidade de ser trabalhada para tornar-se fecunda. Reza muito, minha filha, e Jesus comunicar-se-á contigo à medida que tu te comunicares com Ele, na oração. Tens necessidade de muitas luzes e de força para desempenhar teu ofício, de acordo com a Vontade divina. Não te contentes de recorrer a Deus somente nas horas destinadas à oração. ... uma união quase contínua entre ti e Ele, te é necessária (Mg., II, pág. 121).

Exortações do Papa Francisco...
             Voz 5.: “A vida do cristão pode ser resumida em três comportamentos: estar “de pé” para acolher Deus, estar em paciente “silêncio” para escutar a Sua voz e “em saída” para anunciá-Lo aos demais. Para encontrar o Senhor, é preciso entrar em nós mesmos e sentir aquele “fio de um silêncio sonoro” e Ele nos fala ali. Devemos sempre buscar o Senhor. Todos nós sabemos como são os maus momentos: momentos que nos puxam para baixo, momentos sem fé, escuros, momentos em que não vemos o horizonte, somos incapazes de se levantar. Todos nós sabemos isso! Mas é o Senhor que vem, nos restaura com o pão e com a sua força e nos diz: “Levante-se e vá em frente! Caminhe!”.”
            


6 - Santificação das ações
                Dir.: Fazendo suas as exortações paulinas sobre a busca da santificação, fala sobre a importância de “cada momento de nossa vida” ser santificado com boas ações e orienta-nos a vivermos em continua união com Deus, exercitando-nos na prática da presença de Deus, para que todas as nossas ações e afetos, sejam eles grandes ou pequenos, sejam unicamente para Deus, transcendam o plano material conduzindo, passo a passo, a uma atitude de total despojamento e abandono em Deus.
                Voz 1.: A Madre considera o tempo, “único e exclusivamente de Deus”, por isso não se pode dispor dele de acordo com a própria vontade, mas de acordo com os desígnios de Deus. Sendo assim, aconselha a “fazer tudo com o objetivo de agradar a Deus”, agir pela estima das criaturas ou por conta própria, fechando-se na autossuficiência, é uma mera perda de tempo. Este tempo, do qual muitas vezes não se tem a consciência de sua existência, devido à rotina das atitudes e atos, vem apresentado nos escritos de Clélia com uma característica eterna. Para ela, o tempo “vale tanto quanto o Sangue de Jesus, pois por Ele fomos resgatadas em todos os momentos”. Admoesta sobre o mau emprego do tempo, e de sua perda inutilmente, exorta e orienta sobre seu uso e aproveitamento, uma vez que nossa redenção e nossa santificação estão intensamente ligadas ao tempo, pois o ato Redentor de Jesus prolonga-se em todos os momentos e em todos os tempos.
Voz 2.: “Por que perdes tanto tempo, assim inutilmente? Não sabes, filha, que o tempo vale quanto o céu, porque o céu é a recompensa atribuída por Deus mesmo, ao bom uso do tempo?” (M.g., I, pág. 11).  
“Sendo o tempo de Deus e não nosso, não temos direito de dispor dele para outro uso diferente daquele que o Senhor nos pede, de acordo com os desígnios que tem sobre cada um de nós; não podemos dispor, nem ceder a míni­ma parte ao gosto ou desgosto do momento, nem pedir conselho ao nosso capricho para o emprego que dele faremos. É preciso fazer tudo com o objetivo de agradar a Deus, porque Deus não recompensa senão o que se faz por Ele. Se se age por conta própria ou pelas criaturas, perder-se-á o tempo e o trabalho.” (M.g., I, pág. 11).
Voz 3.: A Madre ensina que todas as atitudes e ações devem ser revestidas de um significado superior. Para que isso seja possível, insiste constantemente sobre a atitude de Fé, que deve estar presente em todas as atitudes e ações da Apóstola, quer sejam materiais ou principalmente espirituais, onde exorta a conservar, no templo de Deus uma atitude externa profundamente religiosa, fruto do recolhimento interno nos pensamentos e afetos, dignos da presença de Deus. A casa de Deus, para ela e suas filhas, é um lugar de amor e reverencia.
Exortações de Madre Clélia...
Voz 4.: Procura, filha, fazer todas as coisas simples e santamente, levando em consideração unicamente agradar a Deus. (M.p., pág. 24). Recorda muitas vezes, que sendo o fim da religiosa, além da exata observância das Leis de Deus, viver unida a Ele, deves exercitar-te frequentemente nos atos de fé, esperança e caridade, adoração, louvor a Deus e humildade. Teu trabalho deve ser sempre acompanhado do espírito de pura e reta intenção e da plena conformidade ao querer divino. (M.p., pág. 1).

Exortações do Papa Francisco...
Voz 5.: “Sorria! Um cristão é sempre alegre;
Agradeça! Mesmo se não “precisar” fazê-lo;
Lembre aos outros que você os ama e cumprimente com alegria as pessoas que você vê todos os dias;
Ouça a história do outro sem preconceito, com amor;
Pare e ajude quando alguém precisar;
Incentive quem está desanimado, corrija com amor e não cale por medo;
Alegre-se pelas qualidades ou realizações dos outros;
Junte as coisas que você não vai mais usar e de a quem precisa;
Ajude quando necessário para que o outro descanse;
Cuide com carinho especial dos que estão perto de você e ajude os outros a superarem os obstáculos;”.



7 - Amor de Deus
             Dir.: Toda a santidade consiste em amar a Deus, e todo o amor a Deus consiste em fazer a sua vontade.  Em muitas de suas cartas, Madre Clélia, se expressa sobre o amor de Deus, suas características e qualidades. Exorta-nos a nos dedicarmos, com todo esforço de que somos capazes, a Deus, que deve ser o único e o Sumo Bem de toda nossa existência. Para que Deus possa reinar e ser realmente o único Senhor na vida de cada uma de nós suas filhas, fala incansavelmente sobre a necessidade de tomar firme e resoluta decisão, para não deixar que nada venha ocupar nossos corações, exceto Deus. Deus ordena tudo em nós, se Ele esta no centro de nossas vidas, todas as outras coisas que amamos ocupam o seu real tamanho em nós.
             Voz 1.: Tendo experimentado, no profundo de seu ser, a consistência do Amor Divino e a debilidade do amor humano, apresenta as diferenças, atribuindo ao amor de Deus a “plenitude da paz” e ao amor das criaturas, “um complexo de amarguras”. Acrescenta ainda que a certeza de ser amada por Deus deve ser um conforto para todas as “aflições da vida”. E como resposta a este amor, Deus, o Sumo Bem, merece todo o nosso amor; é preciso amá-lo sem medidas e com todo o nosso ser. O amor de Deus deve estar presente no coração humano, na espontaneidade de um ato de reconhecimento de sua soberania e de gratidão pelo dom da própria existência. Não amá-lo, segundo Madre Clélia, é cometer um tríplice pecado: de desprezo, de injustiça e de ingratidão, pois tudo o que somos e temos recebemos de Deus, e Ele, infinitamente bom e perfeito, merece todo o nosso amor.          
             Voz 2.: Apresenta Maria Santíssima como modelo de consagração por sua pronta fidelidade à graça, por seu recolhimento, vivendo por Deus e em Deus, e nos convida a imitá-la nessa perfeita correspondência à graça, dedicando toda a sua vida, única e exclusivamente para Deus. Adoremos o Espírito Santo que inspirou a Maria, ainda menina, a resolução de abandonar sua família e todas as doçuras do lar doméstico, para fechar-se na solidão do Templo e levar uma vida toda recolhida em Deus e por Deus. Congratulemo-nos, filhas, com a Virgem Santa, pela perfeita correspondência à graça, e alegremo-nos de vê-la em tão tenra idade, assim avançada na santidade. Filhas caríssimas, demo-nos a Deus sem demora, como fez a Virgem Maria.” (M. g., I, pág. 167).
             Voz 3.: Ama-se a Deus por aquilo que Ele é não por aquilo que Ele pode nos dar. Ele é o único Bem. A felicidade se encontra no amor de Deus, e sendo este superior a todas as ciências do mundo, com o amor de Deus se é sempre feliz. O amor de Deus deve ser “tudo para a alma, todo o resto deve ser nada”. Deve-se dedicar a Deus um amor superior a tudo o que possa existir. Deus deve ser amado o “quanto Ele é digno de ser amado”. Para Madre Clélia as qualidades do amor que deve envolver a vida da Apóstola em resposta ao amor de predileção com que Deus a ama compreendem a um amor forte e vigoroso, ardente e invencível, inabalável, humilde, para que só Deus seja exaltado.
Exortações de Madre Clélia...
Voz 4.: Roguemos ao Senhor, que nos tire tudo, exceto seu puro amor; então... estaremos contentes, e deixaremos de boa vontade tudo por seu amor. Deixando-nos seu amor, deixar-nos-á tudo o que queremos; seu puro amor é tudo para nós, tudo o mais é nada. Seria nada a própria imortalidade de nossa alma, se por ela não nos fosse dado seu santo amor; pois seria melhor ser aniquilada a partir deste momento, que perder por um só instante a esperança de ser amada por Ele, bondade infinita. Ó bom Deus, fazei que possamos amar-vos o quanto sais digno de ser amado! (M.g., I, pág. 102).
Exortações do Papa Francisco...
             Voz 5.:  
8 - Amor ao próximo
             Dir.: A caridade foi a grande virtude vivida e praticada por Madre Clélia. Confirmam-no seus escritos e sua vida, através de inúmeros fatos. O amor ao próximo em sua vida foi como um abismo profundo. Quanta delicadeza e dedicada caridade para todos, sem acepção de pessoas. O fundamento e a inspiração que a conduziu à observância radical dessa virtude foi o preceito evangélico: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. Ela encarnou esta prática em sua vida, tendo como único mestre e modelo Jesus Cristo. Em seus ensinamentos concebe a caridade como a primeira de todas as virtudes, a “virtude por excelência”.

             Voz 1.: Só a sua prática verdadeira e sincera é suficiente para fazer de uma comunidade um paraíso. A verdadeira caridade começa em casa e não é possível o exercício do apostolado, com corações ofendidos e divididos. É uma ilusão querer fazer o bem fora e prejudicar o bom andamento da comunidade. Sem a prática da caridade não existe santidade, pois esta se consegue com as pequenas coisas, e a virtude que sobressai a todas as outras é a caridade. Esta requer o respeito recíproco, e todos os cuidados que o bem do próximo exige. Clélia orienta-nos a compadecer-se e a desculpar-se reciprocamente, reconhecendo mutuamente os próprios defeitos. Para ela a caridade é a síntese da Lei de Deus e a estrada da santidade.

             Voz 2.: Deve-se vigiar sobre as próprias palavras e conduta, sempre com um caráter de edificação, para que sejamos coerentes. Praticar com o máximo zelo, pois seremos tratados com a mesma medida com que tratarmos nosso próximo. Orienta a superar as dificuldades apresentadas no relacionamento provocado pelas antipatias e limitações, usando os ensinamentos de Jesus, pois a caridade deve ser a pedra mais preciosa a brilhar em nosso Instituto. A falta de caridade provoca desunião, partidos, divisões e a ruína do Instituto. A caridade exige sacrifícios, é necessário aprender com Jesus a amar as coirmãs, suportando-as em tudo e perdoando sempre, mantendo-se dispostas e prontas para o bem de cada uma. O amor ao próximo desterra toda maledicência ou crítica, toda zombaria e depreciação. Clélia Merloni nos ensina a fazer o bem com palavras, com o exemplo e com a oração.

             Voz 3.: Apresenta a correção fraterna como o primeiro e o mais belo ato de caridade e misericórdia ensinado por Jesus. Deve ser feita com delicadeza, em tempo e lugar adequados, para que possa produzir efeitos eficazes. Deve-se esperar o momento certo e oportuno, para usar de correção fraterna. Quem corrige deve estar tranquilo e livre de qualquer paixão, pois quem esta sendo corrigido, deve ver claramente que quem corrige o faz por um simples ato de amor, visando o bem. Fala também do bom exemplo que devemos dar, pois a inconstância no bem demonstra falta de virtude, dá mau exemplo aos seculares e é uma porta aberta à mediocridade. Nossa conduta deve edificar a todos, principalmente nas coisas cotidianas e habituais.

Exortações de Madre Clélia...
Voz 4.: “Exercitai-vos muito na caridade, naquela caridade que deve ser a pedra mais preciosa que deve brilhar no nosso Instituto. (M.g., II, págs. 99 - 100). Em tudo e em toda parte, deveis fazer com que a caridade do vosso celeste Esposo Jesus ocupe o primeiro lugar. Usai a caridade com semblante suave e sereno, com fisionomia afável, com palavras doces e cordiais; usai a caridade indulgente, vendo sempre o lado bom e interpretando favoravelmente tudo o que se diz, desculpando os outros, ainda que com prejuízo próprio, até que a prudência o permita. Não deveis mostrar nenhum descontentamento pela rudeza ou enfermidade do próximo; deveis aceitar com afabilidade e doçura os conselhos, as repreensões, as mortificações, quaisquer que sejam; vigiai sobre vossas palavras e sobre vossa conduta, para não dizer nada e nada fazer que desagrade; para fazer e dizer tudo de amável, permitido pela consciência”. (M.g., Ir, pág. 107).
Exortações do Papa Francisco...
             Voz 5.: “A caridade é simples: adorar a Deus e servir aos outros.”




9 - Reparação, restaurar a imagem danificada!
             Dir.: A devoção ao Sagrado Coração de Jesus constitui o carisma deixado por Madre Clélia. Esta devoção implica “amor, glória, reparação e imolação”. Nossa Madre recebeu esta devoção em sua fonte e para ela a devoção ao Sagrado Coração de Jesus implica glorifica-Lo, tornando-O conhecido e amado. Sendo assim, concebe a reparação como uma consequência do amor que dedica ao Coração de Jesus. Recebendo de Jesus o convite para ser “Apóstola de seu amor”, concebeu em seu ser o verdadeiro espírito de seu Instituto: ser Apóstola do Amor a exemplo dos Apóstolos. A reparação, então, é revestida do caráter de zelo apostólico que deve impulsionar a Apóstola a viver em contínuo Espírito de reparação.

             Voz 1.: Ela viveu este espírito de reparação de modo heróico, oferecendo-se e imolando-se pela salvação dos pecadores, não poupando um só instante de seus sofrimentos e dores. As crônicas dos últimos dois anos de sua vida narram que estava muito doente, mas que seu leito se tornara uma “cátedra”. Clélia não mediu esforços para que suas filhas pudessem compreender o verdadeiro espírito de reparação e deixa claro que esta deve ser ininterrupta. Toda a vida da Apóstola deve ser ato de reparação, de restaurar o mundo danificado pela falta de amor, “colocando” amor onde este perdeu o sentido.

Voz 2.: O Senhor te ajude a fazer em cada momento sua adorável vontade, de modo que cada sofrimento seja um ato de fervorosa e nobre reparação aos ultrajes que os maus fazem continuamente ao Sagrado Coração de Jesus... Procuremos, filhas, usar todos os meios que o Senhor nos oferece para torná-lo conhecido, amado e servido...; aproveitemos, com prazer, todas as ocasiões para ganhar-lhe almas, mesmo com prejuízo dos nossos bens, nosso repouso, nossa própria vida. Antes, devemos alegrar-nos, se com tais meios, pudermos obter que mais um coração sobre a terra, possa amar o Senhor. Quanto mais virmos o bem a fazer, mais devemos fazê-lo, e jamais dizer basta;” (M.g., I, pág. 100).
Voz 3.: A orientação educativa de Madre Clélia, quando trata da formação do verdadeiro espírito de suas filhas, vem acompanhada de um convite, que é mais um testemunho de sua própria vida do que um simples ensinamento. Orienta a fazer atos de fé, de adoração e de cordial homenagem para reparar continuamente as ofensas que o Coração de Jesus recebe. Na vida cotidiana, as atitudes da Apóstola devem reparar a humanidade que sofre pelo pecado e pelo afastamento de Deus, seu testemunho de vida, as palavras que dirige aos outros, o amor que dedica aos filhos de Deus são capazes de restaurar tantos corações despedaçados que sofrem e precisam redescobrir o amor de Deus que gera vida em abundância.
Exortações de Madre Clélia...
Voz 4.: “Oh! atiremo-nos generosamente; aos pés do Crucifixo, e falemos-lhe, não mais das nossas cruzes, mas das necessidades dos nossos irmãos; ofereçamos-lhe todos os nossos sofrimentos, sem medi-los nem contá-los (como quem esvazia o bolso na mão do pobre, sem verificar a quantia), a fim de que, unindo-as às suas, tenha nas mãos a moeda de resgate para qualquer pobre alma que o demônio já considera sua.” (M.p.,  p., pág. 151).
Exortações do Papa Francisco...
Voz 5.: “É preciso usar de misericórdia, ‘misericordiar’, para receber misericórdia, para ‘ser misericordiado’. O fato de a misericórdia pôr em contato uma miséria humana com o coração de Deus, faz desencadear imediatamente a ação; não se pode meditar sobre a misericórdia, sem pôr tudo em prática. Por isso, na oração, não nos ajuda intelectualizar. Com a ajuda da graça, o nosso diálogo com o Senhor deve se concretizar sobre o meu pecado que requer que a misericórdia do Senhor pouse sobre mim, o pecado de que sinto mais vergonha e maior desejo de reparar”.





Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...