LAVA-PÉS:
para
uma “Igreja da toalha”
“Cristo monumentou a Humildade quando beijou os
pés dos seus discípulos”(Manoel deBarros)
O
gesto do “lava-pés” é paradigmático
para todo seguidor de Jesus Cristo; constitui um dos gestos mais expressivos da
missão e da identidade para aqueles que exercem algum serviço em sua
comunidade.
É
revelação e ensinamento. É amor e mandamento. É gesto-vida, gesto-horizonte,
gesto-luz...
Não podemos amar o outro e olhá-lo de cima. Não se
trata também de se “humilhar”, de se colocar “abaixo” de seus pés, mas de cuidarde
seus pés para que esse outro possa se manter de pé, para que ambos possam estar
face a face e caminhar juntos.
Jesus sabia que seus discípulos tinham pés frágeis,
pés de argila. Amar alguém não é querer que ele fique deitado a seus pés, mas é
querer que ele se mantenha de pé, na plenitude de sua grandeza. Amar alguém é
querê-lo com os pés “livres, leves e soltos”. Lavar os pés é gesto de humanização
e gesto humanizante. É devolver ao outro a dignidade e capacidade de dar
destino à sua vida.
A cena do lava-pés revela profundidade e
delicadeza, mútuo dom e acolhimento, comunhão e cuidado. É um gesto profético,
repleto de generosidade e de humildade.
O
Evangelho de S. João substitui a instituição da Eucaristia pelo Lava-pés.O gesto escandaloso de Jesus
revela um enfoque nem sempre percebido em seu sentido profundo. Ele revela aos
apóstolos um “novo ângulo”ou um novo modo de ver as coisas: não a
partir do lugar dos comensais, mas a partir da pers-pectiva de
quem não está sentado à mesa.O gesto de Jesus nos convida a deslocar-nos,
ou seja, ocupar o lugar da pessoa que não participa da mesa. Quê novidadepercebemos
a partir deste lugar?
Jesus deixa transbordar os
segredos de seu coração. Ele revela o rosto de Deus, que é Amor.
Ninguém serve a Deus, a não
ser do jeito de Jesus, isto é, lavando os pés, amando até o fim.
Mistério da Encarnação: Deus
abraçando e sendo encontrado junto aos pés dos seus filhos(as).
“Levanta-se da mesa” –
“senta-se à mesa”: movimento de partida e de chegada; mesa que se projeta no serviço,
mesa que faz memória festiva, mesa do encontro...
O “descendimento” do Senhor aos pés dos
discípulos, fazendo-se servidor, transforma o status da servidão (“o servo não sabe o que faz seu senhor”) em fraternidade
(“não vos
chamo servos, mas amigos).
Deste
modo se mostra o verdadeiro senhorio
de Jesus: a possibilidade de resta-belecer a igualdade entre as pessoas através
da superabundância de um amor que se
derrama, sem reservas, para todos. Este gesto provocativo de serviço e
despo-jamento d’Aquele que é “Senhor”
desperta em cada seguidor o desejo de consi-derar suas qualidades e capacidades
como veículos de doação, não de poder ou de manipulação. A partir deste “ousado
gesto” já não se justifica nenhum tipo de superioridade, mas somente a
relação pessoal de irmãos e amigos.
A
reação de Pedro expressa bem o escândalo que este gesto produz, porque Jesus
revela que a autoridade -ser Senhor
– é um serviço, não uma dominação.
Pedro
fica desconcertado e em dilema. Sua imagem do Messias seguro e vence-dor não
combina com a vulnerabilidade de um servo.
O
gesto do lava-pés é repleto da “espiritualidade
do cuidado”.
O cuidado é um diálogo de presenças, não só de palavras. São seres“vulneráveis”
que dialogam.
O cuidado é expressão de ternura e delicadeza. É atenção às pessoas;
é gesto de inclusão.
O cuidado é gesto
amoroso para com o outro, gesto que protege e traz serenidade e paz.
O amor é a expressão
mais alta do cuidado, porque tudo o que amamos cuidamos. E tudo o que
cuidamos é um sinal de que também
amamos. Cuidar é envolver-se com o outro ou com a comunidade de vida,
mostrando zelo e preocupação. Mas é sempre uma atitude de benevolência que quer
estar junto, acompanhar e proteger; é ter espírito de gentileza e ternura para
captar e sentir o outro como outro, como original, e acolhê-lo na sua diferença.
O Lava-pés nos pede vestir a toalha da simplicidade, da ternura acolhedora, da
escuta comprometida, do serviço desinteressado...
Lava-pés não é teatro, mas modo habitual de proceder e de estar no mundo.
Texto bíblico:Jo.
13,1-17
Na oração: Como posso vivenciar, no
cotidiano, a beleza e o cuidado revelados no gesto do lava-pés?