SE O TRIUNFO E O ÊXITO “SOBEM” À CABEÇA”...
“Trouxeram o jumentinho e puseram sobre ele suas
vestes, e Jesus montou” (Mt 21,7)
No Domingo de Ramos, ao fazer memória da entrada
de Jesus em Jerusalém, costumamos realizar procissões triunfais, com palmas e
cânticos, com os sacerdotes revestidos de preciosos
ornamentos...
No entanto, convém
recordar como Jesus se situou frente a isso que chamamos triunfo.
Um triunfo e um êxito retumbante é o que esperavam todos aqueles que o seguiam
desde a Galiléia; esperavam um novo Davi poderoso, o rei por excelência, o
ungido, o conquistador, o unificador, o que iria devolver a Israel a soberania, a paz, a abundância, o predomínio
sobre as demais nações... Aquele que faria com que todas as nações viessem
adorar a Deus em seu santo Templo de Jerusalém, o Messias, luz das nações e
glória de seu povo Israel.
Mas Jesus frustra
esta expectativa: durante toda sua vida pública Ele se empenhou em afastar-se
dessa imagem triunfal, evitou a propaganda e a fama de curador poderoso, pediu
para manter oculto seus milagres, fugiu daqueles que queriam fazê-lo rei,
anunciou repetidas vezes que seu fim era a rejeição, a perseguição, a
condenação por parte dos poderosos e a morte na cruz.
A subida a Jerusalém
é penosa, marcada por conflitos e os discípulos cada vez mais distantes do
pensamento do Mestre pois disputavam entre eles quem ficaria à direita ou à
esquerda no Reino. Jesus passou a vida inteira desmontando a idéia de triunfo e
êxito que imperava no povo e em seus amigos.
Com sua “entrada
em Jerusalém”, Jesus desconcerta a todos. Seu gesto provocativo revela que não
podemos compreender sua missão com base no poder e na força que
se impõem, pois onde há poder não há amor e nem misericórdia.
Os poderosos tem
pavor daquele que vem sem nada, despojado de tudo, sem poder, anunciando a chegada
do Reino, ou seja, de uma humanidade diferente, fundada na verdade e na
solidariedade verdadeira.
Ele queria
entrar na cidade oferecendo uma mensagem de pacificação e um programa de
libertação, como fizera durante sua estadia na Galiléia. Deixa transparecer que
a salvação de Deus não vem do triunfo político, da aclamação social, da
imposição dos de cima, da opressão por parte da religião...
Por isso, como mensageiro de paz,
chegou Jesus a Jerusalém montado num jumentinho. Não precisava de
soldados e nem de instituições de violência para se defender. Sem armas de
guerra, sem um possante cavalo, sem poderes e nem ambições..., mas montado num
jumentinho de paz, um jumentinho empresta-do e novo, não domado, pois Jesus não
possuia nem um jumentinho.
O “êxito”
de Jesus consiste no fato de ser capaz de ir até o final, de ser coerente com a
proposta de vida, de ser fiel à vontade do Pai; seu êxito consiste em não querer triunfar e dominar como
todos esperavam.
Este
gesto escandaloso de Jesus, ao entrar em Jerusalém, também desmonta toda
pretensão de triunfo e êxito presente tanto no mais profundo de nosso ser como
na estrutura eclesial. Nada mais contrário ao seu seguimento do que querer
triunfar sobre os outros, lutando por poder, prestígio, influência social,
espetáculo, carreirismo...
Este é o “vírus” que a todos
infecta; todos perseguimos o triunfo,todos buscamos o êxito frente às aspirações e propósitos
que vamos assumindo ao longo de nossa existência. Todos, em um grau maior ou
menor, de uma maneira ou de outra, buscamos o êxito e lutamos, às vezes com
muito custo, para evitar o pólo oposto: o
fracasso.E na luta por obter triunfo e êxito nos esforçamos, nos identificamos
com deter-minados modelos, elaboramos estratégias, passamos por cima dos
outros... Em resumo, todos gastamos importantes quantidades de energia para não
nos esbarrarmos em possíveis fracassos.
Brilhar diante
dos outros, levar vantagem em tudo, alcançar a fama e o reconhecimento público,
aparecer nos meios de comunicação social, ser relevante ou influente no próprio
grupo social ou institucional,conquistar uma posição de poder e prestígio..., aparecem
em nossas sociedades como uma das metas mais importantes a alcançar na vida.
Daí a proliferação de recursos que são oferecidos no mercado para a conquista
de tal propósito e as ansiedades que essa mesma busca provoca.
Contudo, no horizonte da Paixão
de Jesus, o fracassotambém tem seu
lugar.
O fracasso constitui a outra face
do êxito, sua contrapartida. Não é possível, por isso, tratar sobre o êxito sem
estar fazendo continua referência ao fracasso.
O que é único e original na
tradição cristã é isso:“O
que é a Cruz, senão a história de um fracasso?”
Fracasso
de um ensinamento, fracasso de uma pregação, fracasso do amor a todos os seres,
amor esse que não foi reconhecido.
Jesus transformou este fracasso em
um caminho para a ressurreição.
Quando
pensamos em nossas vidas, quando as vemos pelo seu exterior, percebemos
inúmeros fracassos. Mas, em segredo,
podemos pressentir que estes fracassos, estas dificuldades são, talvez, a nossa
maior sorte. Porque através deles nos libertamos de nossas ilusões sobre nós mesmos.
Eles tendem a nos deprimir, mas também podem ser uma ocasião para nos fazer
mais humanos e humildes.
Através
dos fracassos nos aproximamos de nosso ser essencial e original, onde estão os
dinamismos capazes de transformar estes mesmos fracassos em caminhos de
realização e crescimento.
O fracasso pode ser percebido como chance para crescimento ou
amadurecimento, ou pode ser integrado à luz de outras experiências positivas.
Aprendemos mais pelos nossos fracassos
do que pelos nossos êxitos.Nossa
existência é constituída de momentos de luta e de coragem, de sonhos e de
esperança, de vitória e de derrota. Este é o material com o qual são
construídas as histórias e as vidas.
O
fracasso, que em muitas ocasiões nos
provoca medo, insegurança, mal-estar... é um espaço perfeitamente adequado para
iniciar o movimento para uma maior expansão de si.
Mais
ainda, muitas vezes são os fracassos
que nos levam a iniciar uma mudança em nossas vidas, para uma
maior realização pessoal e, portanto, para uma maior satisfação interior.
Para
muitos, os fracassos os afundam num
abismo de impotência e agressividade; para outros, ao contrário, os fracassos os convertem em seres
incrivelmente sensíveis, compassivos, humildes...
Os
fracassos nos revelam aspectos novos
de nós mesmos e nos ajudam a conhecer-nos mais.
“Há coisas que não se compreendem enquanto não se
esteja definitivamente derrotado” (Péguy)
Os
fracassos tem poder de revelação:
ser o que a pessoa é e nada mais que
aquilo que é. A experiência dos fracassos nos une a todos, nos iguala,
é fonte de comunhão... Graças aos fracassos,
a pessoa vai quebrando, pouco a pouco, seu instinto de posse, a auto-afirmação
de si, a prepotência, a soberba...
Texto
bíblico: Mt
21,1-11
Na
oração: Fazer
memória da entrada de Jesusem
Jerusalém implica descer com Ele à
nossa cidade interior e ali esvaziar toda busca de poder e prestígio, desalojar
tudo aquilo que se ali-menta de êxito e triunfo, e assim destravar a vida
verdadeira que quer se expandir.
“Descer” com Jesus
nos humaniza interiormente e nos move a viver uma relação mais humanizadora com
os outros, fundada na compaixão, na acolhida e no compromisso solidário.