SAL E
LUZ, PRESENÇA QUE FAZ A DIFERENÇA
“Vós sois o sal da terra… Vós sois a
luz do mundo” (Mt
5,13-14)
O Evangelho de hoje vem imediatamente após a
proclamação das Bem-aventuranças. Isto quer dizer que aquelas e aqueles que
fazem das Bem-aventuranças o programa da sua vida, são chamados a uma respon-sabilidade
real e atual, ou seja, eles/elas não vão se tornar sal da terra e luz do
mundo no futuro, mas devem ser presença diferenciada no aqui e agora,
humanizando as relações e comprometendo-se com a vida mais justa e plena.
Jesus diz: “Vós sois”; não diz “deveis ser”, ou “tenhais que vos
converter em...” “Sois”: expressão que se refere à existência toda do(a)
seguidor(a) de Jesus, em qualquer circunstância e tempo. Quem segue a Jesus
Cristo, afetado por seu chamado, torna-se plenamente convertido em sal da terra
e luz do mundo.
“Sal da terra…, luz do mundo”: muitas vezes estas duas imagens
foram entendidas em chave proselitista, de um modo sumamente atraente para o
ego e gratificante para a mente.
Ao ego lhe atrai sempre
considerar-se em posse da verdade, particularmente por dois motivos: porque
isso lhe traz uma sensação de segurança e porque lhe permite manter uma imagem
de si “acima” daqueles que, para ele, se encontram no erro. Ao ego lhe encanta
ser “especial”, brilhar, aparecer... Ao ego lhe encanta que o reconheçam como
“sal” e como “luz”, já que ele não busca outra coisa a não ser sentir-se
reconhecido a qualquer preço.
Se permanecermos no clima das bem-aventuranças,
cairemos na conta que a pessoa que é chamada a ser sal e luz não sai publicando
por aí; ela é sal e luz não por suas ideias, doutrinas ou
normas morais que busca impor aos outros, mas por ela mesma, por aquilo que ela
é em sua interioridade.
Concretamente, é “sal” aquela pessoa que nos ajuda a saborear a vida com mais
profundidade, porque seu gosto por viver nos contagia e nos apoia para que
possamos experimentar isso também.
É “luz”
porque, com sua presença amorosa, dissipa nossas obscuridades e facilita que
percebamos o senti-do luminoso de nossa existência, de nossa verdadeira
identidade.
Ser “luz” e “sal”, portanto, é o
mais radicalmente oposto a qualquer atitude de superioridade e de proselitismo.
Nem a vaidade, nem o fanatismo trazem sabor e luz.
A vida de Jesus aparece como
“sal” e como “luz” pelo que Ele era e vivia. Sua mensagem era sumamente
simples, centrada no compromisso com todos e numa presença compassiva; afinal
de contas, “sal” e “luz” é outro nome da compaixão. Jesus despertou um
movimento humanizador, carregado de sabor e iluminação, afetando a todos que
d’Ele se aproximavam. Ele não estava preocupado em fazer prose-litismo, nem
anunciar uma nova religião, uma doutrina mais palatável... Sua presença
des-velava a luz e o sal presente em toda e qualquer pessoa.
«Vós sois o sal da
terra…” “Vós sois a luz do mundo…”: constitui uma das afirmações evangélicas
mais claras de que a missão dos seguidores de Jesus no mundo faz parte de sua
própria identidade. Duas pequenas imagens ou afirmações para duas grandes
atitudes.
As imagens do sal e da luz servem
também de apoio para justificar duas formas diferentes de presença e de ação no
mundo. A referência ao sal remete a
uma ação invisível, pois concebe a presença dos cristãos no mundo sob a forma
da encarnação, a presença silenciosa na realidade, a inserção na sociedade,
deixan-do atuar, pelo testemunho de cada um, a força do evangelho que, como a
semente, uma vez semeada, germina no campo, de dia e de noite, sem que o
semeador perceba.
O específico da luz, por outro lado, é brilhar, ou seja, esta imagem realça uma
forma de presença visível, através das ações comunicativas e, especialmente, do
anúncio explícito, como meios para fazer chegar o evangelho ao mundo no qual o
cristão é chamado a ser presença diferenciada.
De
acordo com o texto, as formas de presença significadas pela luz e pelo sal são,
as duas, inseparáveis. São duas formas de presença no mundo; duas formas de
exercício da missão, de um modo de proceder que se dá por “contágio ativo”,
caracterizado pela hospitalidade, o amor mútuo, a caridade para com os pobres,
a alegria contagiante...
O símbolo da luz é ainda mais rico do que o do sal: a luz ilumina, aquece, guia, agrega, tranquiliza, reconforta. A
Luz é força fecundante, princípio
ativo, condição indispensável para que haja vida. Tem capacidade de purificar e
regenerar. Em oposição às trevas, a Luz
exalta o que belo, bom e verdadeiro.
Vivemos imersos num oceano de luz; carregamos
dentro a força da luz. Ela sempre está aí, disponível; basta abrir-nos a ela
com a disposição de acolhê-la e de fazer as transformações que ela inspira.
Pelo fato de ser benfazeja e criadora, a luz
nos permite dizer com o poeta Thiago de Mello, no meio de impasses, ameaças e
conflitos que pesam sobre nossa vida: “Faz escuro, mas eu canto”.
Há aqueles que, ao invés de serem presenças
iluminadoras, estão mais preocupados em subir e ocupar a posição do candeeiro,
para aparecer, para se colocar acima dos outros, serem vistos e elogiados pelas
pessoas. Quem aspira estar no candeeiro revela não ter luz para iluminar os
outros, mas uma luz auto-referente. O candeeiro não é para que os vejam; o candeeiro
é para que a luz de suas vidas se expanda e ilumine melhor; o candeeiro não é
para que estejam mais altos, mas é para que a luz de suas vidas chegue a
lugares mais distantes.
O ser humano é luz quando expande seu
verdadeiro ser, ou seja, quando transcende e vai mais além, desbloqueando as
ricas possibilidades de humanidade. A luz, por si mesma, é expansiva.
Um fotógrafo profissional fez a
seguinte afirmação: “minha profissão é escrever com a luz; muitos escrevem com letras, eu com a luz”. As fotografias dependem de como
a pessoa administra a luz.
Uma preciosa motivação a buscar a
luz dentro de nós mesmos, a buscar esse “retrato interior” que é movido a se
expor diante dos olhares dos outros. Nossa vida pode ser apaixonante se a
contemplamos e a construímos como um diálogo de vida e de luz.
O salmista utilizará um registro
parecido, contemplando nosso espaço interior como uma fonte de luzes; uma fonte
que deixa transparecer aquela Luz profunda que nos leva por caminhos de paz e
serenidade:
“Pois em Ti está a Fonte da vida e à tua
Luz vemos a luz” (Sl 36,10).
Deixemo-nos iluminar pela Luz de
Deus, levemos a Luz nas nossas
pobres e frágeis mãos, iluminando os recantos do nosso cotidiano.
Somos uma “sarça ardente” diante dos outros, consumindo-nos constantemente, no
humilde serviço; somos uma lamparina humilde, brilhando na janela da nossa
pobre casa, indicando aos outros o caminho da segurança e do aconchego.
Texto bíblico: Mt
5,13-16
Na
oração: Sinto-me
uma lâmpada com a responsabilidade de
iluminar no meio da sociedade?
-
Quê atitudes e comportamentos meus projetam luz para potenciar a tímida luz
presente no outro?
-
E quais projetam sombras, para poder erradicá-las? Na família, no trabalho, na
comunidade cristã?
-
Estou integrado ou devo integrar-me em alguma comunidade, grupo ou movimento
eclesial, para ser luz coletivamente? A
quê compromissos concretos o Espírito me impulsiona pessoalmente e à nossa
comunidade para ser luz em nosso entorno?