JESUS, PURA TRANSPARÊNCIA DO
ROSTO MISERICORDIOSO DO PAI
“Jesus Cristo é o rosto
da misericórdia do Pai. O mistério da fé cristã parece encontrar nestas
palavras a sua síntese. Tal misericórdia tornou-se viva, visível e atingiu o
seu clímax em Jesus de Nazaré. Com a sua palavra, os seus gestos e toda a sua pessoa, Jesus de Nazaré revela a
misericórdia de Deus”. (Papa Francisco –
Misericordiae Vultus)
Tornar presente o Pai como Amor e Misericórdia foi, para Jesus, o cerne de sua missão: toda
a sua vida foi uma eloquente demonstração da misericórdia divina para com a humanidade.
Jesus,
presença visível da misericórdia, revela um Deus desprovido de dogmatismos, de
controle e de po-der. O Deus de Jesus não é um juiz com um catálogo de leis que
tem necessidade de mandar, controlar, verificar... Basta-lhe a misericórdia, a compaixão...
Jesus propõe
um modo de ser humano inseparável da
misericórdia do Pai:
“Sede misericordiosos como o Pai é misericordioso” (Lc. 6,36)
Ser misericordioso “como” Deus constitui o mais elevado convite e a mensagem mais
profunda que o ser humano recebe sobre como tratar a si mesmo e aos outros.
“A
misericórdia de nosso Senhor se manifesta sobretudo quando Ele se inclina sobre
a miséria humana e demonstra sua compaixão, para quem necessita de compreensão,
cura e perdão. Tudo em Jesus fala de misericórdia; mais ainda, Ele mesmo é a
misericórdia”
(Papa Francisco.
Jesus, com sua presença desconcertante,
relativiza costumes, ritos e práticas religiosas, inclusive o Templo, e se
relaciona com gente excluída e de má reputação. Ele faz muitas coisas e em
muitos lugares (ensina, cura, denuncia, alimenta, dialoga, etc), mas a misericórdia é a que inspira e move
tudo em sua vida e ação. Sente a fundo o sofrimento das pessoas; antes de
preocupar-se com o pecado, preocupa-se em aliviar a dor da marginalização e
exclusão.
Este “princípio-misericórdia”
é o que há de iluminar e conduzir a vida dos seguidores de Jesus, e da Igreja
como comunidade misericordiosa.
A misericórdia é, pois, um sentimento profundo e dinâmico, que não
permite que quem o sente permaneça imóvel ou passivo diante de tanto sofrimento
que há na humanidade. Ela é a alma da solida-riedade, da ação social, do
compromisso com a justiça...
Por um lado, a misericórdia é
propriamente a atitude permanente que se revela em qualquer situação, sempre
que há fraternidade e amor, e por outra parte, a misericórdia é a compaixão
para com a pessoa que sofre. Uma atitude profunda, uma comoção do coração, que
conduz a atos de solidariedade...
A presença misericordiosa de Jesus aparece claramente no jantar em casa
do fariseu Simão.
O relato de Lucas põe
em confronto duas maneiras diferentes de reagir perante a “mulher pecadora”: uma,
de acolhida e proximidade; outra, de julgamento e distância.
Uma mulher,
pecadora pública, aparece inesperadamente no jantar na casa do fariseu, sem ter
medo do que dirão a respeito dela. Há nela como uma espécie de ansiedade e
desejo de sair daquela situação; há nela uma necessidade de sentir-se pessoa,
de sentir-se mulher de verdade, de recuperar sua dignidade, de sentir-se livre.
Busca alguém que não a veja como
simples objeto de prazer; busca alguém que saiba reconhecê-la como pessoa, que
possa devolver-lhe sua dignidade. E não se importa com as reações de julgamento.
Prostra-se aos pés de Jesus, derrama o perfume que possivelmente era fruto do
seu pecado. Lava os pés de Jesus com suas lágrimas de angústia e confiança ao
mesmo tempo, antecipando o gesto que Jesus realizará na última Ceia. Seca-os
com seus cabelos como expressão de sua esperança.
Jesus revela-se um convidado perigoso, porque é
capaz de des-velar o que está encoberto. Sua presença cria problemas para o anfitrião, coloca em
risco o seu prestígio, a sua reputação.
Jesus desmascara a
maneira medíocre de amar do fariseu, desprovido de compaixão e calculista no
julga-mento. O fariseu
perfeito tem comportamento frio, legalista, insensível, indiferente,
rígido.
O perfeccionista
e o legalista
é um ser anestesiado e petrificado: nele a misericórdia permanece
atrofia-da; ele ficará confinado dentro de um eu inchado e vazio, que caminha sobre pernas de barro.
Onde o
legalismo prevalece, ali a misericórdia não encontra espaço para reconstruir
relações quebradas.
Por isso, Jesus
revela o abismo que existe entre a posição em que o fariseu se encontra e a da
mulher que, através de tantos gestos afetivos, expressa sua ternura e
humanidade.
“Entrei em sua casa e não me derramaste água nos
pés...
Não me deste um ósculo... Não me derramaste óleo
na cabeça”.
Aquele fariseu tinha muitas
coisas para dar a Jesus, mas não lhe deu nada de amor; aquela mulher não tinha
nenhuma coisa que dar-lhe, mas lhe deu o melhor: muito amor. O fariseu não
esperava nada de Jesus, aquela mulher esperava tudo d’Ele. Aquele fariseu e os
demais convivas a julgam como pecadora pública, mas Jesus a reabilita diante
deles; Ele a acolhe com respeito e ternura. Descobre em seus gestos um amor
limpo e uma fé agradecida. Diante de todos, fala com ela para defender sua
dignidade e revelar-lhe como Deus a ama.
Jesus é capaz de reconstruir o
que os outros haviam destruído; é capaz de devolver a alegria a uma mulher que
os outros tinham tirado; é capaz de dar a vida àquela que os outros deram
morte.
Jesus não se fixa na vida passada da mulher;
por isso, não a julga, pelo contrário, valoriza todos os seus gestos de
acolhida e ternura. Não importam “seus muitos pecados”, mas o amor de seu
coração.
Jesus não é daqueles que se entretém
contabilizando pecados; Ele é daqueles que olha o coração do peca-dor; e quando
descobre amor, aí mesmo perdoa. Porque a melhor expressão de amar é perdoar; a
melhor expressão de sentir-se perdoado é sentir-se amado.
O perdão não é um problema de
justiça; o perdão é algo que nasce do amor; o perdão é fruto da compreensão, da
misericórdia.
O comportamento de Jesus era
diametralmente oposto ao do fariseu e dos seus convivas: todas as mulheres que
se encontraram com Ele sempre saíram reabilitadas, até o ponto de chegarem a se
converter em protagonistas do fato mais importante de Sua vida, a ressurreição.
A linguagem de Jesus para aquelas pessoas que
praticavam uma religiosidade vazia, só ritual e elitista, era muito dura e
crítica. Como no caso deste fariseu religioso, legalista refinado, são muitos aqueles
que afirmam e honram a Deus com os lábios, mas seu coração e seus atos estão
muito longe d’Ele.
A maioria das religiões dá muita importância ao
cultual, às cerimônias, aos ritos. Gastam muito dinheiro em objetos, roupas,
ornamentos, imagens, ostentações, etc..., mas o compromisso com os grandes
valores do Evan-gelho, que são o essencial da mensagem de Jesus, fica ofuscado
ou esque-cido. É urgente retornar à fonte do Evangelho, onde a misericórdia
é o atributo essencial e o modo de proceder de todo seguidor de Jesus.
Texto bíblico: Lc. 7,36-50
Na
oração: O olhar de misericórdia
deve ser continuamente ativado para
poder perceber a nobreza
escondida no interior de cada um, sobretudo naqueles que estão mais excluídos.
Para despertar este olhar
cristificado necessitamos de uma revolução do afeto e da ternura; só assim
poderemos olhar a nós mesmos e as pessoas com o olhar carregado de
misericórdia.
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O que prevalece em seu agir cotidiano: misericórdia? preconceito? suspeita?
julgamento?...